quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Carlos Primati fala sobre a produção de notícia no cenário cultural


Por Matheus Ferraz

Carlos Primati é um dos maiores especialistas no cinema de horror do Brasil. Foi editor da finada revista Cine Monstro (que sobrevive hoje em forma de blog), dedicada inteiramente ao gênero, e colabora também com as publicações Estado de S. Paulo, Folha de S. Paulo, Jornal da Tarde, Bizz, Set, General, Heroi, Conecta, Dark Side, DVD Total, Show Time, Mundo Estranho, Flashback, entre diversas outras. Seu currículo ainda inclui a coprodução da coleção de DVD's de Zé do Caixão, e a ministração de diversos cursos sobre cinema .

Conversamos com Primati, que falou sobre sua curiosa carreira no ramo do jornalismo cultural.
Não sei se realmente serei útil para ajudar nessa questão, pois minha trajetória é pouco convencional. Desde cedo me interessei por cultura pop - cinema, música, quadrinhos, essas coisas - e comecei a escrever sobre isso num jornal aqui da minha cidade, em Jundiaí, quando tinha dezessete anos. Foi meu irmão, que trabalhava como diagramador no jornal, quem me indicou e deu essa dica de profissão para eu seguir. Neste começo, como era um jornal de interior, eu tive bastante liberdade, e praticamente escrevia um caderno cultural inteiro aos domingos: críticas de discos, de filmes, matérias sobre quadrinhos etc.
Como comecei a trabalhar cedo nisso, acabei nem me formando na faculdade; sou um jornalista por prática, não por formação. Pouco depois fui oferecer meus serviços para jornais e revistas grandes de São Paulo, e minha carreira desde então tem sido de colaborador freelance nesta área. Nunca me interessei em ser redator efetivado de nenhuma publicação, pois não tenho intenção de sair da minha cidade e muito menos de ir todo dia a São Paulo de ônibus.

O processo de trabalho nessa área - pelo menos para mim - é relativamente simples, e envolve basicamente conhecer os colaboradores que se tem à disposição. Sempre que um tema está em evidência, seja algum artista com um trabalho novo, ou estilo que está chamando a atenção ou alguma efeméride, o editor pauta o colaborador para que escreva sobre aquele tema. Durante algum tempo eu me especilizei em séries de televisão, então até hoje sou pautado para escrever desde breves perfis até dossiês de séries clássicas (de "Agente 86" a "Jornada nas Estrelas"). Também me dedico a estudar o cinema de horror mundial, e sempre que o tema está em destaque, também costumam me chamar para escrever algo sobre o assunto.

O processo de escrever sobre isso passa obrigatoriamente pela bagagem de conhecimento que se acumula sobre o tema, basicamente tendo um interesse específico nisso. Eu, por exemplo, tenho mais interesse em cultura pop do que em jornalismo - ainda que o jornalismo, o ato de "escrever bem", seja uma paixão minha e uma busca permanente. Não adianta nada saber muito e ser incapaz de passar isso para o leitor, mas tampouco é tolerável não se saber nada e tentar convencer o leitor que você tem intimidade com o assunto. Mesmo em tempos de internet, quando qualquer consulta rápida à Wikipedia aparentemente resolve a questão de "pesquisa", ter um vasto material de referência (livros, essencialmente) é indispensável para que se exerça decentemente essa atividade. Como exemplo, posso citar um artigo que escrevi na semana passada, para a revista Monet, sobre o filme "Alien, o 8º Passageiro". Fui pautado para esse artigo justamente porque o editor conhece o meu perfil e teve a convicção de que eu seria a pessoa ideal para escrever sobre o filme. Para escrever o artigo, recorri à minha coleção particular de DVDs, que inclui diversos documentários sobre o filme (era um artigo sobre os bastidores da produção). Entra em questão também a minha capacidade de processar essas informações, saber contextualizar o que há de mais importante para apresentar ao leitor de maneira que ele compreenda o valor histórico e cultural do filme em questão.

Quanto à editoração, é essencial que se esteja antenado com o que acontece no panorama cultural, pautar as matérias de maneira criativa e original e ter os redatores adequados para cada assunto. Digamos que estejamos na época do festival Rock in Rio. Um bom editor estudaria com carinho a programação e pautaria reportagens que fossem mais atraente; por exemplo, um artigo crítico avaliando se o Guns N'Roses ainda é uma banda de rock relevante no cinema internacional; qual é a verdadeira importância que se dá aos grupos nacionais (por exemplo, por que bandas consagradas como Sepultura e Os Mutantes se sujeitaram a tocar num palco secundário?), e assim por diante. Aí entra em questão, como já falei, a capacidade e conhecimento do redator em defender pontos de vista, de ser crítico e opinativo, e não meramente informativo, como seria o caso do jornalismo de geral, cidade e polícia. É uma área mais livre, onde a personalidade do jornalista vale mais do que seu talento para escrever.

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